quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Eu tenho um sonho!

O mês passado  no meio da azáfama de começo de aulas estava eu a identificar os livros da minha filha com ela ao lado quando liguei a TV. Estava na SIC e deixei estar. Estava a dar o programa da tarde com um grande ênfase sobre a nova telenovela da SIC, um grande tempo de antena. Estavam a falar especificamente da Cova da Moura, na Amadora, com pequenas reportagens no bairro, um senhor a explicar que cresceu, estudou e formou-se advogado, e com uma modelo que veio propositadamente dos EUA para fazer parte da telenovela.
B olhava como que hipnotizada para a TV e pergunta: “Onde é a Cova da Moura?”. Expliquei onde fica. Fez silêncio, entretanto uma rapariga é entrevistada e explica que foi vítima de racismo numa entrevista de emprego, uma vez que mencionou que morava na Cova da Moura. Vi nos olhos da minha filha que não estava a perceber, tal a inocência. Perguntou “Racismo? Mas porque mora na Cova da Moura?”. Fui muito crua quando lhe respondi: “Bea, nunca esperes ter a vida facilitada porque tens essa cor de pele linda, porque és mulher e porque moras na Amadora”.
Nisto oiço o advogado formado criado na Cova da Moura, explicar o que eu já tinha percebido, é difícil ser-se preto, ser-se da Amadora e ainda por cima da Cova da Moura. Que a Cova da Moura é problemática, é, mas tem muita gente boa e trabalhadora, e que é um bairro que tem muita vida.
Bom, não vejo telenovelas, mas tive que lá ir espreitar e o cenário “está um pouco cor de rosinha”. , Como em todo o lado há pessoas más e pessoas boas. E existe um programa social muito bom que conheço há alguns anos. Sei que tentam fazer um grande trabalho em tirar alguns miúdos da “má vida”, um trabalho um pouco ingrato, mas muito recompensador.
À Cova da Moura fui muito poucas vezes, acho que conto pelos dedos de uma mão. Lembro-me que cada vez que lá entrei, sabia que todos sabiam que eu estava a entrar e que era uma desconhecida, portanto aquilo não é assim tão idílico como parece.
E só quem não conhece pode falar com sorrisinhos e mandar bitaites, porque na nossa generalidade temos muito medo do desconhecido.
Apenas retenho que a minha filha ainda não tem noção do que é e um dia, tal como a mãe, alguém vai lhe partir o coração por causa de um pequeno grande pormenor, que é a sua cor. A mim cabe-me prepará-la, tentando não envenená-la com ideias pré-concebidas. Ela já está no quinto ano, agora é que vai começar a perceber o que é o Mundo.
E venho outra vez apelar ao sonho de Martin Luther King:
“ …, eu tenho um sonho. O sonho de ver os meus filhos julgados por sua personalidade, não pela cor de sua pele...”

 
https://beu77.blogspot.com/2017/10/all-lives-matters.html


 

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