Se calhar devia ter começado com este texto, quando
anunciei o regresso das escritas.
Aqui vai. Atualmente com 46 anos.
Parece tão corriqueiro dizer isto, mas o tempo passa
mesmo num instante.
Há vinte anos se me dissessem que ia acontecer o que
aconteceu, com certeza não teria prosseguido com um trajeto pessoal, que não
tinha pernas para andar. Mesmo que o amor parecesse infinitos. Porque na
verdade, eu já sofria em silêncio, não o sabia, mas era um sofrimento de
incertezas em relação ao meu futuro marido. Apenas prolonguei o sofrimento, por
amor, por teimosia, por uma necessidade extrema de querer ser “normal”.
Hoje sei que o normal, não é normal, ou seja, o que é
normal para mim, não é normal para a minha mãe por exemplo, ou não é normal
para a minha amiga e assim sucessivamente.
O que é o normal?
Será o normal monótono? Ir para casa, depois do trabalho,
cozinhar para o marido e para as crianças, arrumar a casa, pagar as contas e
apenas e só isto. Ou isto é um sonho de vários alguéns e apenas isto lhes
chega?
Será o “normal” ter esta vida e não fazer nada de
“anormal” para ter dinheiro no banco, se acontecer alguma coisa? Qual coisa?
Somos futuristas? Estamos a supor uma coisa que se calhar nunca vai acontecer?
Sim, ok, agora estamos num Governo, que nos está a
sufocar com tantos aumentos, com as mesmas desculpas que já ouvimos de outros
Governos, mas com outras palavras.
Sim temos que estar com atenção, pensar numa reforma bem
confortável, mas e VIVER?
Hoje sei que a ideia do meu “normal” naquela altura,
tivesse seguido em frente, essa crença de um percurso “normal”, eu não
seria a pessoa que sou hoje. Seria uma pessoa aborrecida, sem conteúdo, seria
uma pessoa insonsa, não me levem a mal.
Hoje sei que há um tempo para tudo.
Se aos vinte e seis anos, se na seguinte lista estiverem
no mínimo, três coisas que ainda não fizeste, viver sozinha, estudar fora,
viajar algumas vezes sozinha ou acompanhada, beber e dançar na rua rindo
alegremente e se a tua experiência sexual se resume a uma única pessoa, então,
então nada sabes.
Eu, nada sabia.
A verdade é que as decisões dessa década definiram, quem
sou hoje. Por mais que o caminho tivesse sido duro, muitas vezes sem qualquer
solução à vista ou qualquer esperança, sou quem sou, por todas as não
experiências dessa década e que mais tarde soube e sei, o que são.
Com o tempo aprendi a não levar as coisas tão a peito.
Com o tempo aprendi a valorizar-me.
Com o tempo aprendi a andar de cabeça erguida.
De não ter medo de defender o que acho que está certo.
A escutar o meu coração, a olhar nos olhos das outras
pessoas sem medos, até com alguma altivez.
Aprendi a amadurecer, mas que a minha
inteligência emocional, precisa muito de melhorar, mas que parar, respirar, refletir, sou mais eficaz.
Aprendi a ser mais crua, mas menos bruta.
Não esperem que ao achar que alguma coisa está mal, eu
não a vou dizer. Talvez vá demorar mais tempo, talvez vá escolher as palavras,
mas pessoas que gosto e que amo vão sempre ouvir a verdade.
Espero o mesmo e nada mais que isso.
Com o tempo aprendi a aceitar que talvez não consiga
jamais vestir um 38, mas aprendi que ao olhar-me com amor e sorrir-me com amor,
eu talvez aceite que que nunca mais vá vestir 38.
Com o tempo aprendi que às vezes não faz mal, não estar
bem. É preciso é dar tempo a esse tempo e no dia seguinte recomeçar, com a
esperança de que a moral não se tenha ido de vez e que se não a sentes, tens de
a ir buscar a algum lado, caminho, pessoa, sorriso, livro, refeição, um
amanhecer ou a um pôr do sol. Uma pequena coisa que olhes e penses, olha que
belo.
Que nas caminhadas ao ouvir os meus podcasts, de vez em
quando faz falta olhar ao teu redor, para as pessoas, umas inexpressivas,
outras de bem com a vida, outras preocupadas, outras tristes ou até mesmo olhar
para um edifício e repares nas bonitas varandas.
Que nas corridas, depois das lebres partirem, os que
ficam ao meu lado, estão ali, com o mesmo sofrimento que o meu, mas com a mesma
determinação que a minha. Que nos trails, nas subidas dolorosas, que pares de
vez em quando porque a dor nas coxas é insuportável ou porque precisas de
respirar, quando chegas lá em cima, pares e olhes em teu redor e vês a paisagem
magnífica. E que ao desceres, repares numa flor ou numa planta que nunca tenhas
visto, que correres à chuva num trail é sentires a liberdade em todos teus os
poros, mesmo que os mesmos estejam cobertos de lama, por causa da queda que
deste minutos antes.
É acabar estafada com os meus 46 anos, com o meu peso e
com as minhas coxas de não corredora, mas com um sorriso de satisfação. Com o
sorriso que horas antes estive na lama, mas que me levantei, continuei e passei
a meta.
Isto é a vida!
P.S.: não sei se repararam, mas este foi um retorno de Be
U e a dar uma de Gustavo Santos mais moderna. Nunca te esqueças quando achas
que estás na merda, há sempre alguém pior que tu.
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