quinta-feira, 6 de abril de 2023

Be U e suas reflexões

Se calhar devia ter começado com este texto, quando anunciei o regresso das escritas.

Aqui vai. Atualmente com 46 anos.

Parece tão corriqueiro dizer isto, mas o tempo passa mesmo num instante.

Há vinte anos se me dissessem que ia acontecer o que aconteceu, com certeza não teria prosseguido com um trajeto pessoal, que não tinha pernas para andar. Mesmo que o amor parecesse infinitos. Porque na verdade, eu já sofria em silêncio, não o sabia, mas era um sofrimento de incertezas em relação ao meu futuro marido. Apenas prolonguei o sofrimento, por amor, por teimosia, por uma necessidade extrema de querer ser “normal”.

Hoje sei que o normal, não é normal, ou seja, o que é normal para mim, não é normal para a minha mãe por exemplo, ou não é normal para a minha amiga e assim sucessivamente.

O que é o normal?

Será o normal monótono? Ir para casa, depois do trabalho, cozinhar para o marido e para as crianças, arrumar a casa, pagar as contas e apenas e só isto. Ou isto é um sonho de vários alguéns e apenas isto lhes chega?

Será o “normal” ter esta vida e não fazer nada de “anormal” para ter dinheiro no banco, se acontecer alguma coisa? Qual coisa? Somos futuristas? Estamos a supor uma coisa que se calhar nunca vai acontecer?

Sim, ok, agora estamos num Governo, que nos está a sufocar com tantos aumentos, com as mesmas desculpas que já ouvimos de outros Governos, mas com outras palavras.

Sim temos que estar com atenção, pensar numa reforma bem confortável, mas e VIVER?

Hoje sei que a ideia do meu “normal” naquela altura, tivesse seguido em frente, essa crença de um percurso “normal”, eu não seria a pessoa que sou hoje. Seria uma pessoa aborrecida, sem conteúdo, seria uma pessoa insonsa, não me levem a mal.

Hoje sei que há um tempo para tudo.

Se aos vinte e seis anos, se na seguinte lista estiverem no mínimo, três coisas que ainda não fizeste, viver sozinha, estudar fora, viajar algumas vezes sozinha ou acompanhada, beber e dançar na rua rindo alegremente e se a tua experiência sexual se resume a uma única pessoa, então, então nada sabes.

Eu, nada sabia.

A verdade é que as decisões dessa década definiram, quem sou hoje. Por mais que o caminho tivesse sido duro, muitas vezes sem qualquer solução à vista ou qualquer esperança, sou quem sou, por todas as não experiências dessa década e que mais tarde soube e sei, o que são.

Com o tempo aprendi a não levar as coisas tão a peito.

Com o tempo aprendi a valorizar-me.

Com o tempo aprendi a andar de cabeça erguida.

De não ter medo de defender o que acho que está certo.

A escutar o meu coração, a olhar nos olhos das outras pessoas sem medos, até com alguma altivez.

Aprendi a amadurecer, mas que a minha inteligência emocional, precisa muito de melhorar, mas que parar, respirar, refletir, sou mais eficaz.

Aprendi a ser mais crua, mas menos bruta.

Não esperem que ao achar que alguma coisa está mal, eu não a vou dizer. Talvez vá demorar mais tempo, talvez vá escolher as palavras, mas pessoas que gosto e que amo vão sempre ouvir a verdade.

Espero o mesmo e nada mais que isso.

Com o tempo aprendi a aceitar que talvez não consiga jamais vestir um 38, mas aprendi que ao olhar-me com amor e sorrir-me com amor, eu talvez aceite que que nunca mais vá vestir 38.

Com o tempo aprendi que às vezes não faz mal, não estar bem. É preciso é dar tempo a esse tempo e no dia seguinte recomeçar, com a esperança de que a moral não se tenha ido de vez e que se não a sentes, tens de a ir buscar a algum lado, caminho, pessoa, sorriso, livro, refeição, um amanhecer ou a um pôr do sol. Uma pequena coisa que olhes e penses, olha que belo.

Que nas caminhadas ao ouvir os meus podcasts, de vez em quando faz falta olhar ao teu redor, para as pessoas, umas inexpressivas, outras de bem com a vida, outras preocupadas, outras tristes ou até mesmo olhar para um edifício e repares nas bonitas varandas.

Que nas corridas, depois das lebres partirem, os que ficam ao meu lado, estão ali, com o mesmo sofrimento que o meu, mas com a mesma determinação que a minha. Que nos trails, nas subidas dolorosas, que pares de vez em quando porque a dor nas coxas é insuportável ou porque precisas de respirar, quando chegas lá em cima, pares e olhes em teu redor e vês a paisagem magnífica. E que ao desceres, repares numa flor ou numa planta que nunca tenhas visto, que correres à chuva num trail é sentires a liberdade em todos teus os poros, mesmo que os mesmos estejam cobertos de lama, por causa da queda que deste minutos antes.

É acabar estafada com os meus 46 anos, com o meu peso e com as minhas coxas de não corredora, mas com um sorriso de satisfação. Com o sorriso que horas antes estive na lama, mas que me levantei, continuei e passei a meta.

Isto é a vida!

 

P.S.: não sei se repararam, mas este foi um retorno de Be U e a dar uma de Gustavo Santos mais moderna. Nunca te esqueças quando achas que estás na merda, há sempre alguém pior que tu.