quinta-feira, 4 de maio de 2023

Be u e suas emoções.

Sabem aqueles dias em que te sentes mesmo em baixo, ouves as notícias e ficas mais triste, olhas lá para fora e está a chover, olhas para a tua conta bancária e está miserável, a tua renda da casa aumentou duzentos euros e não sabes como te vais safar, alguém próximo de ti está muito doente, não estás com motivação para nada, foste ao médico e sentes que estás a lutar contra uma coisa que volta e meia vences a batalha, mas não a guerra? Esses dias.

Acho que todos nós de vez em quando sentimos isso. Uns mais intensamente que outros, outros mais barulhentos que outros, outros mais mal-humorados ou mais chorosos. 

Há dias que choro, não parece, mas sim, choro. É raro eu chorar. Quando choro é às escondidas. Não gosto que ninguém veja. E apesar de o evitar, é um alívio porque significa que não sou um robot, que não sou hipócrita ou fria e que consigo chorar.

Chorar não é um ato regular na minha vida. Sempre aprendi a controlar esse choro à medida que fui crescendo, o que tornou-me assustadoramente fria.

Lembro-me de ter chorado infinitas vezes na adolescência quando partiram-me o coração e que muitas vezes chorei enquanto namorava com o pai da minha filha.

Depois de adulta quase nunca chorei perto da minha mãe. Não sei explicar, talvez é um ato de proteção para com ela. Não gosto de vê-la triste quando estou triste. Dói-me a alma vê-la assim, sempre que posso, escondo.

Na minha fase adulta, a minha mãe, das poucas e únicas vezes que me viu chorar, foi quando lhe telefonei a dizer que ia sair de casa, deixar um casamento de seis anos. Ela apenas disse “eu vou-te buscar à paragem”.

E quando me viu, eu vinha com lágrimas a escorrer na cara. Sem dizer uma única palavra, apenas tirou-me a miúda dos braços, olhou para mim e disse “não chores por aquele estupor, ele não merece uma única lágrima tua”.

Sempre fui assim, uma criança que chorava silenciosamente. A minha mãe ralhava e eu não dizia nada, apenas chorava. Talvez por saber que se chorasse a minha mãe ia ficar triste. A minha mãe apesar de não parecer, é uma pessoa extremamente sensível, só passado muitos anos é que tive essa claridade, mas no fundo eu sempre soube.

Uma vez chorei à frente da minha filha, muitos anos mais tarde, tinha ela uns dez anos. Não estava a aguentar a pressão de ser mãe trabalhadora de uma menina tão respondona e indomável, estava a tomar conta de mim. Então sentei-me à beira dela e perguntei-lhe porque me tratava assim, como se eu tivesse alguma culpa, quando era a pessoa que mais a amava. Ela fez o mesmo, que eu fazia em pequena, chorou silenciosamente e adormeceu. Naquele momento crescemos as duas um bocadinho.

Com o passar do tempo fui percebendo que ela ao invés de gritar e de espernear ou de responder-me, foi-se calando, fechando-se cada vez mais e até tornar-se num cofre.

O silêncio é um grito demasiado alto, então fui à psicóloga com a minha filha. Fez o desfavor de nunca lhe dizer uma única palavra durante um mês. Duzentos e cinquenta euros para o lixo, desisti, mas não foi preciso muito para ela própria perceber que precisava de falar com alguém. Primeiro foi a psicóloga da escola e depois a uma particular. E a diferença foi enorme, começou a falar, a chorar num filme emotivo, começou a partilhar mais coisas da escola, a partilhar o seu mundo de amigos na nossa casa e na dos avós.

Isto para vos dizer que a Minimi aprendeu uma lição muito valiosa, muito mais que eu e a maioria das pessoas. Sentiu que precisava de ajuda para gerir as suas emoções.

É aqui que eu quero chegar, gerir emoções. Seja stress, tristeza, alegria e frustração.

Faltam-nos essas ferramentas. Não nos foram ensinadas, não quisemos aprendê-las no devido tempo ou não queremos olhar de frente para elas. Aquela velha questão “se não pensarmos, está tudo bem”.

Não está tudo bem. A verdade é que há dias em que estamos no fundo do poço e que precisamos mesmo de falar com alguém, precisamos de deitar tudo cá para fora.

Uma sábia menina de 30 anos ao dizer-lhe que eu estava a pensar em coisas para estar ocupada, porque a minha cabeça às vezes está demasiado irrequieta disse-me que deveria ver isso mais de uma outra perspetiva, de talvez precisasse de falar sobre isso com um profissional.

A questão e minha resposta é que fazendo uma introspeção, não estou preparada para me sentar num sofá e ir escarafunchar o que está no fundo do poço.

Se por um lado quando minha filha depois das sessões vinha mais leve, mais faladora, mais comunicativa. Por outro lado, a sua bagagem é diferente da minha e das outras pessoas, cada um tem sua bagagem emocional. Não sei se sairia dali contente. Acho que não. Na verdade, acho que estou a adiar a ida. Procurando ajudas em livros de autoajuda, discursos motivadores e podcasts, mas essencialmente escrevendo.

Costumava dizer na passagem do ano que queria ser uma pessoa melhor, no final de janeiro isso já tinha ido à vida. Na realidade, a minha nova resolução é ser realmente uma pessoa melhor, mas aceitando-me como sou. Desbocada, sincera, sem filtros, mas com mais cuidado. Dou por mim a praticar a empatia, quase todos os dias. A pôr-me no lugar do outro.

Nunca sabes o que se passa do outro lado.

 Eu sei que a nossa dor é só nossa e que cada um reage como sabe. 

No meu caso quando estou mesmo lá em baixo, faço o seguinte exercício e sugiro que o façam também:

- Pensa nas saudades que alguém está a sentir de alguém por culpa da distância.

- Pensa nas pessoas que sofrem tanto mentalmente, que caem numa profunda depressão ao ponto de se magoarem.

- Pensa nos sem abrigos num dia de frio ou de chuva.

- Pensa nas crianças que vão para a escola e só têm uma refeição por dia,

- Pensa nas crianças e mulheres que são maltratadas e os seus agressores saem em liberdade,

- Pensa em alguém doente numa cama de hospital sozinho.

- Pensa na Injustiça da Igreja Católica que não expulsa os padres que estão a ser acusados de pedofilia, “porque até haver provas estão inocentes” …

Sozinhos não conseguimos mudar o mundo, mas se sairmos da nossa redoma e dermos a mão a alguém, estamos a mudar o mundo dessa pessoa.

Chora, limpa as lágrimas e vai fazer alguma diferença na vida de alguém.

"Tristeza é quando chove
quando está calor demais
quando o corpo dói
e os olhos pesam
tristeza é quando se dorme pouco
quando a voz sai fraca
quando as palavras cessam
e o corpo desobedece
tristeza é quando não se acha graça
quando não se sente fome
quando qualquer bobagem
nos faz chorar
tristeza é quando parece
que não vai acabar."

-Martha Medeiros-